UOL - O melhor conteúdo

Endometriose: quando a dor vai além do corpo e atinge o sonho da maternidade

A doença atinge uma em cada dez mulheres em idade fértil e pode comprometer a fertilidade se não for diagnosticada e tratada com atenção

A endometriose é uma doença silenciosa, complexa e, muitas vezes, invisível. Trata-se de uma condição inflamatória crônica que afeta aproximadamente 10% das mulheres em idade reprodutiva — cerca de 8 milhões de brasileiras, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS). Pode causar dor intensa durante o período menstrual e impactar diretamente a saúde reprodutiva, sendo uma das principais causas de infertilidade feminina.

A endometriose ocorre quando o tecido semelhante ao endométrio (camada que reveste o útero) cresce fora do útero, como nos ovários, trompas ou intestino. Mesmo fora do lugar, esse tecido continua respondendo aos hormônios do ciclo menstrual, o que provoca dor pélvica intensa, cólicas incapacitantes, desconforto nas relações sexuais e alterações intestinais e urinárias.

Infertilidade: um dos principais impactos da doença

Estudos indicam que entre 30% e 50% das mulheres com endometriose apresentam dificuldades para engravidar. Uma pesquisa recente publicada na revista Human Reproduction com mais de 18 mil mulheres mostrou que aquelas com endometriose confirmada cirurgicamente tinham maiores taxas de dor pélvica, diagnóstico de infertilidade e uma redução significativa nas taxas de nascidos vivos.

A infertilidade pode ocorrer por diversos mecanismos:

  • Aderências pélvicas e obstrução das trompas, dificultando o encontro entre óvulo e espermatozoide
  • Inflamação crônica, que afeta a qualidade dos óvulos e o ambiente uterino
  • Alterações hormonais e imunológicas, que comprometem a ovulação e a receptividade endometrial

Muitas mulheres só descobrem que têm endometriose após tentativas frustradas de engravidar, o que torna o diagnóstico ainda mais difícil e doloroso. A média de tempo para diagnóstico da doença varia de 7 a 10 anos — um atraso que pode causar impactos físicos e emocionais significativos.

Diagnóstico precoce faz diferença

O reconhecimento dos sintomas e a realização de exames adequados são essenciais. Exames como a ressonância magnética pélvica e a ultrassonografia com preparo intestinal ajudam a mapear a extensão da doença e guiar a melhor conduta terapêutica. O acompanhamento especializado também é essencial para avaliar a fertilidade da paciente e indicar o tratamento mais adequado.

Tratamentos e preservação da fertilidade

As abordagens para tratar a endometriose e preservar a fertilidade incluem:

  • Tratamento hormonal, para pacientes com dores intensas que não desejam engravidar
  • Cirurgia conservadora (geralmente por laparoscopia), para remoção das lesões e melhora das chances de concepção
  • Reprodução assistida, com destaque para a fertilização in vitro (FIV), especialmente para pacientes acima de 35 anos ou com doença avançada
  • Preservação da fertilidade com congelamento de óvulos, indicado antes de cirurgias ovarianas ou para quem deseja adiar a maternidade

O congelamento antes da cirurgia permite armazenar óvulos em melhores condições, reduz a pressão para engravidar logo após o procedimento e pode ser parte de um plano individualizado que alia o tratamento da endometriose ao planejamento reprodutivo.

Dor não é normal

Cólicas intensas, dores durante as relações sexuais ou no período menstrual não devem ser tratadas como “coisa de mulher”. A endometriose exige atenção, acolhimento e informação. Procurar um ginecologista diante de qualquer sintoma é fundamental para garantir qualidade de vida e manter o sonho da maternidade vivo.

Para mulheres com endometriose, o congelamento de óvulos pode ser um ato de autocuidado e liberdade: a possibilidade de preservar o direito de escolher o momento certo para ser mãe.

Maria Cecília Erthal (CRM 408660 RJ – RQE 30301)
Médica especialista em Reprodução Assistida e membro da Brazil Health

Compartilhe com seus amigos!