“Eles vão fazer isso. Eles vão fazer isso. Eles vão fazer isso, ok?” — repetiu Donald Trump sobre sua ideia de transferir os palestinos civis de Gaza para a Jordânia e o Egito. “Fizemos muito por eles, e eles vão fazer isso”, acrescentou.
“Eles” e os representantes palestinos já repetiram: “não, não, nunca”. A extrema direita israelense é favorável. Para ela, Gaza deve ser colonizada como a Cisjordânia e o Golã, como foi antes do acordo de paz com o Egito.
O enviado especial de Trump ao Oriente Médio, Steve Witkoff, o primeiro funcionário do governo americano a visitar Gaza em 15 anos, anteontem, veio do setor imobiliário. Com olhos de corretor, ele disse: “Há uma percepção de que podemos chegar a um plano sólido para Gaza em cinco anos. Mas é impossível. Este é um plano de reconstrução de 10 a 15 anos. Não resta nada de pé. Há muitas munições não detonadas. Não é seguro caminhar. É inabitável.”
Sem eletricidade, sem água, “a destruição é impressionante”, comentou Witkoff a Barak Raviv, da plataforma Axios, em entrevista exclusiva. Ele viu o êxodo dos civis palestinos para o Norte, do alto, em um helicóptero: “As pessoas estão se mudando para o norte para voltar às suas casas e ver o que aconteceu, dar meia volta e sair…”
Ao descrever Gaza como terra arrasada, Witkoff poderia estar justificando o plano de Trump de transferência da população civil para os vizinhos Egito e Jordânia. Mas não: ele garantiu que só soube dele enquanto já estava no Oriente Médio.
O presidente egípcio Abdel Fatah el-Sissi reagiu ao novo mantra de Trump, que surgiu depois que ele. anunciou a retomada do Canal do Panamá e o desejo de posse da Groenlândia: “Isso nunca poderá ser permitido ou tolerado por causa de seu impacto na segurança nacional egípcia”.
Para a Jordânia, a proposta de Trump gera amargas lembranças do “Setembro Negro”, em 1970, quando as tropas do reino expulsaram os palestinos da OLP, deixando entre 3 e 5 mil mortos, e os obrigaram a um êxodo em massa para outros países árabes, especialmente o Líbano. Nas primeiras negociações de paz depois que o presidente egípcio Sadat visitou Jerusalém, em 1977, Israel costumava argumentar que “já existia um país palestino, a Jordânia — e, então, por que outro?”
O rei Abdullah também não quer nem discutir o plano Trump de transferência de palestinos, chamado de “limpeza étnica” nos jornais árabes. Junto com Abdel el-Sissi, ele quer pedir a Arábia Saudita uma reunião de emergência da Liga Árabe para uma oposição pública e final à ideia. A agência de notícias americana Associated Press ouviu de um palestino de Gaza: “Se o cessar-fogo é bem-sucedido ou não, nunca deixaremos o norte e a cidade de Gaza novamente”.
As negociações para a segunda fase do cessar-fogo e mais seis semanas de trégua em Gaza já estão na fase preliminar. Mas nada deve ser resolvido até o resultado do encontro entre o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu e o presidente Trump, marcado para a próxima quarta-feira, em Washington. Neste sábado, pelo acordo da primeira fase, mais três reféns israelenses devem ser trocados por cerca de cem prisioneiros palestinos.