Moisés Rabinovici: Irã e Israel corrigem declarações de Trump

Trump pressiona por desmantelamento total do arsenal iraniano; Netanyahu condiciona apoio à destruição das instalações nucleares

Estados Unidos e Irã terão uma primeira negociação nuclear, sábado, em Omã — “direta” entre os dois países, segundo Donald Trump, ou “indireta”, com mediador omani, para o chanceler iraniano Abbas Araghchi.

O primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, que dizia ter só três inimigos, “Irã, Irã, Irã”, e que promete dia sim, outro também, explodir as instalações nucleares iranianas, foi usado pelo presidente Trump, na Casa Branca, para mostrar ao mundo árabe que conta com o aval israelense.

Mas nem tanto. Antes de embarcar nas Asas de Sion, o avião oficial de Israel, ele gravou um vídeo que foi exibido na mídia israelense, no qual esclarece que só apoia as negociações se elas implicarem na destruição do arsenal nuclear iraniano. Resumiu assim seu papel ao lado de Trump: “Concordamos que o Irã não terá armas nucleares”. E falou do “exemplo” líbio: “Os soldados entram, explodem as instalações, desmantelam todos os equipamentos, sob supervisão e execução dos Estados Unidos. ”

Netanyahu gosta mais da segunda opção bem ao estilo trumpiano: “Se o Irã falhar, estará em sério perigo. Eles não podem ter armas nucleares. Não é uma fórmula complicada. Se as conversas fracassarem, acho que será um dia ruim para o Irã”, declarou Trump – ele que retirou os EUA do acordo nuclear com a República Islâmica, sete anos depois de assinado em Lausanne, na Suíça, em 2015.

O chanceler iraniano Abbas Araghchi não deu atenção às ameaças de Trump. “Esta é uma oportunidade, mas também um teste. A bola está no campo da América. ” Do lado dos EUA, o negociador será Steve Witkoff, já envolvido nas negociações Rússia-Ucrânia e Israel-Gaza. A palavra da Rússia veio via porta-voz do Kremlin, Dmitri S. Peskov: “Apoiamos resolver a questão do dossiê nuclear iraniano por meios políticos e diplomáticos”.

O Irã estaria a cinco dias de montar seis bombas nucleares primitivas, segundo a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). E os Estados Unidos estão reforçando suas forças no Oriente Médio, com aviões despachados para a sua base na ilha Diego Garcia, e novos porta-aviões no Mediterrâneo.

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Justiça proíbe Netanyahu de demitir seu espião-chefe

Inflado pelos elogios do presidente Trump em Washington, ontem, o primeiro-ministro Netanyahu foi esvaziado, hoje, em Tel Aviv, pela decisão do Supremo Tribunal de Justiça que o proíbe de demitir o chefe do serviço secreto interno de Israel, Ronen Bar, que ele persegue desde o início da investigação do escândalo Catargate, embora não esteja diretamente envolvido, até o momento.

A decisão do STJ é provisória. Até 20 de abril, o governo e o procurador-geral do estado devem concluir um compromisso que encerre a disputa legal. O primeiro-ministro Netanyahu está proibido de anunciar substitutos em potencial para Ronen Bar, como tem feito, e nem o impedir de prosseguir suas investigações.

Foram 11 horas de uma caótica sessão no STJ, conduzida por três juízes, entre eles o presidente da corte, Isaac Amit. Manifestantes pró-governo foram removidos da audiência, depois de várias interrupções. Entre as petições examinadas, a acusação de “claro conflito de interesse” de Netanyahu ao demitir Ronen Bar, por causa, entre outras, da investigação sobre o Catargate, e da suspeita de que procura de um bode expiatório para a invasão do Hamas a Israel, em 7 de outubro de 2023. O governo tem barrado a criação de uma Comissão de Inquérito Independente, sob a justificativa de que ela não deve funcionar enquanto a guerra continua. O chefe do Shin Bet assumiu sua parcela de culpa e prometeu renunciar, como já fizeram alguns importantes oficiais das Forças de Defesa de Israel (FDI). Enquanto não renuncia, ele ajudou a liderar a guerra em Gaza, Líbano, Irã e no Iêmen, e foi um dos principais negociadores para troca de reféns com prisioneiros palestinos

Netanyahu argumenta que tem todo o direito por lei de demitir o chefe do serviço secreto. “Duplamente”, ele acrescentou, à luz das falhas que abriram a guarda de Israel aos terroristas do Hamas. Não é, porém, o que pensa o juiz Sohlberg, um conservador, que declarou: “As obrigações e princípios da lei administrativa ainda se aplicam”. E o juiz Barak Erez completou: “Este tribunal considerou, desde a década de 1960, que nenhum órgão do governo tem total poder discricionário. ”

Desde que tomou posse em 2022, Netanyahu tem tentado enfraquecer o judiciário, com várias reformas para dar mais poder ao executivo. Os israelenses saíram em massa às ruas em defesa da democracia, de uma justiça intocável e de imprensa livre. O massacre do Hamas, que pegou o país não só desprevenido, mas dividido, interrompeu o processo. Agora, se Netanyahu rejeitar a legitimidade do STJ, estará criada uma grave crise constitucional.